Tropas da Arábia Saudita e dos EAU invadem o Bahrein com permissão da família real

Nas últimas semanas, os governos das principais potências mundiais têm debatido, em diversas instâncias, o que fazer diante da situação de guerra civil em que a Líbia se encontra. Preocupações como viabilidade, custos e riscos de uma operação militar, bem como possíveis reflexos no mundo árabe e na legitimidade das leis internacionais têm pautados as discussões, transformando a Líbia em uma interminável polêmica internacional. Enquanto isso, os emirados e reinos do Golfo Pérsico, pouco ligados às nações de lei internacional e legitimidade vigentes no mundo ocidental, decidiram tentar resolver uma crise semelhante no Bahrein de forma bem mais pragmática e simplista. Nesta segunda-feira, tropas da Arábia Saudita e dos Emirados Árabes Unidos (EAU) invadiram o Bahrein – a pedido da família real barenita – para conter os protestos contra o governo iniciados há um mês.

A ação militar se deu na manhã desta segunda-feira (14), quando um comboio de 150 blindados e outros veículos do Exército saudita cruzaram a ponte que divide a Arábia Saudita do Bahrein, levando pelo menos mil homens para o país vizinho. A intenção oficial, segundo disse um membro do governo saudita ao jornal The Wall Street Journal, era “ajudar a proteger pontos estratégicos” do Bahrein em meio aos protestos contra a família. A mesma justificativa deu o ministro das Relações Exteriores dos Emirados Árabes, Anwar Mohammed Gergashnwar Mohammed Gergash. “Os Emirados Árabes Unido assegura que esse paso representa a personificação de seu compromisso com os irmãos do Conselho de Cooperação do Golfo”, disse Gergash ao jornal local The National. “Isso também expressa evidentemente que a segurança e a estabilidade regionais requerem de nós, neste momento, união para proteger conquistas, deixar a luta sectária de lado e colocar as bases para o futuro”.

O Conselho de Cooperação do Golfo citado pelo ministro árabe é uma organização multilateral que reúne, além de Bahrein, Arábia Saudita e EAU, Kuwait, Omã e Catar. Em comum, além da localização geográfica ao redor do Golfo Pérsico, todos são monarquias hereditárias, que não têm a menor intenção de ver a “onda democrática” que passa pelo norte da África chegar ao golfo. Por enquano, o Bahrein, onde reina Hamad ibn Isa Al Khalifa, é o país mais afetado pela onda entre os membros do conselho. Desde 14 de fevereiro, a população protesta contra o governo e pede o fim da monarquia da família Khalifa. Por trás das manifestações populares, há insatisfações com a economia e a falta de liberdades civis. Soma-se a isso, o tempero sectário do conflito no Bahrein. Al Khalifa e a elite do país são sunitas, e tentam controlar há déadas uma população majoritariamente (entre 60% e 70%) xiita, o que torna o Bahrein um país altamente instável. Como fizeram Zine El-Abidine Ben Ali, na Tunísia, e Hosni Mubarak, no Egito, Al-Khalifa aposta na violência contra sua própria população para se manter no poder, mas vem tendo dificuldades para conter o levante. Foi assim que surgiu a necessidade de intervenção estrangeira.

Como não podia deixar de ser, a oposição barenita criticou duramente a ação militar. “Nós consideramos a entrada de qualquer soldado ou equipamento militar no reino do Bahrein como uma flagrante ocupação”, disse o partido xiita Wefaq, em um comunicado. Nabeel Rajab, do Centro de Direitos Humanos do Bahrein, foi pela mesma linha. “Este é um assunto interno e vamos considerar isso como uma ocupação”, afirmou ele à rede Al Jazeera. “Este passo não é bem-vindo pelos barenitas, não é aceitável. Temos um regime repressivo apoiado por outro regime repressivo”, afirmou.

O Bahrein, que abriga a Quinta Frota Naval dos Estados Unidos, é um dos principais aliados americanos na região. Durante os protestos, a Casa Branca vem apoiando a família Al Khalifa ao mesmo tempo que pressiona o rei a atender algumas demandas da população. Nesta segunda, o secretário de Estado assistente para assuntos do Oriente Próximo, Jeffrey Feltman, disse que o governo Barack Obama estava “definitivamente preocupado” com a invasão e que o Bahrein precisava de uma “solução política, não militar”.

Apesar das negativas de Bahrein, Arábia Saudita e Emirados Árabes, é possível crer que ação militar dos países do golfo é uma tentativa de suprimir de uma vez por todas o levante barenita. O que conta a favor dessas famílias reais, é que suas preocupações coincidem com as dos Estados Unidos e de outras potências ocidentais. A primeira é que o Irã aproveite a instabilidade no Bahrein e consiga cooptar a população xiita local, deixando a situação ainda mais caótica. A outra é que o levante se espalhe para o golfo e ameace o grosso da produção de petróleo mundial, especialmente na Arábia Saudita, colocando toda a economia em risco. O que contraria o Ocidente é o pouco apreço que as monarquias do golfo têm pelos direitos humanos. Mas com Estados Unidos, França e Reino Unido mais preocupados com a Líbia, e agora, com a crise nuclear no Japão, é bem possível que as monarquias árabes consigam conter a oposição barenita sem atrair críticas da comunidade internacional.

FONTE: Época

COLABOROU: Ivan

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Wagner
Wagner
13 anos atrás

Uma atuação igual a da antiga Santa Aliança. Se fizermos uma comparação, um dos paises desta antiga aliança, a Inglaterra, logo tornou-se progessista e deixou de apoiar essa Santa Aliança, deixando Austria, Russia e outros sozinhos.

Será que a Arábia Saudita será a Inglaterra local ??? Uma perspectiva interessante…

Mas se fosse o contrário, se fosse o Irã atuando a favor dos xiitas, a comunidade internacional estaria em polvorosa.

Teerâ x Riad : um complexo jogo de xadrez…

Marco Antônio
Marco Antônio
13 anos atrás

Reforço, em forma de pergunta, uma colocação do Wagner: E se fosse o Irã invadindo algum país sunita para manter uma ditadura violadora dos direitos humanos de orientação anti-EUA?

Parece piada, mas, para alguns, democracia só é obrigatória pra inimigo…..e tem gente que não enxerga, ou diz não enxergar esta verdade…..e pior, tem aqueles que tentam justificar, defender, etc….

Aqui vai um belo lema para esta turma: “A palavra está garantida a quem pensa como eu. Para os demais, a censura.”

Vader
13 anos atrás

Isso é intervenção. Não há outro nome para isso. Espero que sejam respeitados os direitos dos manifestantes.

O problema não é o Bahrein. O problema é a crise se alastrar para a Arábia Saudita. Se ISSO acontecer, o mundo entra em polvorosa mesmo.

Aí não será só “uzamericanu” que irão sofrer as consequências. Com o petróleo a 500 dólares o barril, todo o mundo passará por restrições duríssimas, a começar pela China, Índia e por nós, que precisamos refinar nosso petróleo pesado e de baixa qualidade no exterior.

Ivan
Ivan
13 anos atrás

É uma intervenção. Mas não foi a primeira vez que o Bahrein sofre intervenção. * Em 1521 foram os patrícios portugueses; * Em 1602 foram os persas, com apoio britânico; * Em 1783 foram os árabes sauditas que conquistaram a “independência” para a ilha; * No século XIX virou protetorado inglês; * Em 1971 consegue novamente a independência, possivelmente com uma ajudinha americana e saudita. A posição estratégica desta ilha é de extrema importância na região. Como sempre falo, olhem o mapa. 🙂 🙂 🙂 Bahrein significa algo parecido como para “dois mares”. Na verdade é uma ilha que fica… Read more »

Marine
13 anos atrás

Pena, era um pais tao moderno, industrializado e entre todos os que estive no Oriente Medio , de longe um dos mais tolerantes e “ocidentais”.

Goodluck people of Bahrain!

Sds!

Wagner
Wagner
13 anos atrás

Vader Vc fala tanto essa palavra ” uzuamericano” que eu sonhei com ela essa noite !!! rsss Sonhei que tava lendo isso em algum lugar que falava sobre tropas brasileiras… vai entender… 🙂 É verdade essa sua colocação, se o petroleo subir assim o mundo inteiro vai sofrer, incluindo… eu e minhas passagens de onibus, que tambem aumentaria. Ja to pagando 2,50 !!! Que absurdo… Ei Ivan obrigado pela aula, eu não sabia patavina sobre o Bahrein. Vamos torcer para que a galera lá não saia se matando igual na Líbia. Já morreu muita gente nessa região… graças ao Kadafi,… Read more »