Soldado brasileiro e crianças haitianas em Cite Soleil, uma seção de Port-au-Prince. (U.S. Navy photo by Mass Communication Specialist 1st Class David A. Frech/Released)

Soldado brasileiro e crianças haitianas em Cite Soleil, uma seção de Port-au-Prince. (U.S. Navy photo by Mass Communication Specialist 1st Class David A. Frech/Released)

 

Gen Ex João Camilo Pires de Campos

No dia 31 de agosto de 2017, tive o privilégio de participar da formatura de encerramento da missão da tropa brasileira no Haiti. Foi o nosso 26º Contingente. Comandantes militares e autoridades civis tiveram esse privilégio. O ponto alto da emotiva cerimônia foi o arriamento, por nossos Soldados, das Bandeiras da ONU e do Brasil. As devoluções foram feitas, respectivamente, à Senhora Sandra Honoré, representante especial do Secretário-Geral da ONU naquela missão, e ao Senhor Ministro da Defesa do Brasil.

Depois de 13 anos, contribuindo com a estabilização, cooperando com missões assistenciais e realizando operações naquele país amigo, visando à garantia da ordem e à busca da segurança, deixamos, brasileiros todos, por intermédio de nossos Soldados, nossa marca de qualidade naquele país-irmão. Antes da solenidade, visitamos autoridades nacionais haitianas, chefiadas pelo Primeiro-Ministro, Senhor Jack Guy Lafontant, que foi acompanhado pelo Ministro da Defesa, Senhor Hérve Denis, e pelo Ministro das Relações Exteriores, Senhor Antonio Rodrigue, antigo aluno do nosso Instituto Rio Branco.

Nas palavras do Primeiro-Ministro, os agradecimentos ao povo brasileiro foram patentes – esse povo que ali estava muito bem representado por seus Soldados: os “bon bagay” (“boa gente” em creole, língua natal haitiana). Ele registrou, ainda, nossas semelhanças e enalteceu o trabalho, considerado excepcional, destacando, particularmente, ante o conflito das gangues; o terremoto de 2010 (220 mil mortos, inclusive 18 Soldados brasileiros); e o furacão de 2016. Nada mais justo!

Será que a população brasileira sabe da atuação dos nossos Soldados diante da catástrofe do furacão Matthew em 2016? Nossa tropa, antecipando-se à tragédia, seguiu para a região onde iria o “olho do Matthew”, buscando, ao já estar lá, as melhores condições para ajudar, amparar, acudir e servir aos nossos irmãos haitianos, que, certamente, seriam flagelados pelo fenômeno que estava a caminho. Que orgulho para todos nós! Que exemplo para o mundo! Mais uma vez, o servir – essa grandeza dos Soldados!

Durante a conversa com aquelas autoridades, pude perceber o óbvio sentimento de satisfação no prosseguimento da vida haitiana com seus próprios cidadãos, com a sua Polícia Nacional e com a sua renascente Força Armada. Dessa forma, o Haiti – primeiro país independente da América Latina e o primeiro a abolir a escravidão – retorna à sua vida soberana.

No trajeto entre a sede do governo (aliás, espartana, arrumada e simples) e a base da tropa brasileira, notei a Bandeira haitiana postada em janelas de humilíssimas residências. Confesso que essa observação me trouxe duplo sentimento: alegria por eles, que, com o pouco que têm, manifestam o orgulho pátrio; e lamento por nós, que, apesar do muito que possuímos, somos, de maneira quase geral, refratários a essa manifestação. Assim, por estarmos na semana de nossa Pátria, faço alguns comentários.

Para acompanhar-me nas 14 horas de viagem (ida e volta), escolhi um livro e um texto. O livro, do excelente escritor brasileiro Alcântara Machado (1901-1935), trata da “Vida e morte do bandeirante”; e o texto, intitulado “Pátria”, foi escrito pelo General Morata, Presidente do Círculo Militar de São Paulo, para a revista daquele Clube. Obra e artigo foram absolutamente complementares. A primeira narra a saga dos bandeirantes e seu papel, entrelaçando raízes portuguesas e indígenas na formação de nossa nacionalidade. O segundo enaltece a importância do patriotismo para todos nós. Pura conjugação! Formação de uma nação, orgulho de uma história, amor ao Brasil e indicação do que podemos e do que queremos para o nosso País.

Nesta semana de comemoração do Dia da Pátria, vale, e muito, essa reflexão! O velho Tenente Siqueira Campos – que nutria grande amor pelo Brasil – e que, além de emprestar seu nome a ruas e praças, pouco antes de sua morte, em 1930, deixou-nos a mais importante de suas frases: “à Pátria tudo se dá e nada se pede, nem mesmo compreensão”. Também para reflexão, pela absoluta concordância, vale buscar o dito do presidente John Kennedy em 1969, nos EUA, por ocasião do discurso de posse: “não perguntes o que a tua Pátria pode fazer por ti; pergunte o que tu podes fazer por ela”.

Muito antes dessas citações, nossa história já havia visto manifestação semelhante. Em 1645, dezoito patriotas, inconformados com o domínio invasor holandês, liderados pelo português João Fernandes Vieira e conduzidos por André Vidal de Negreiros (branco), Felipe Camarão (índio) e Henrique Dias (negro), registraram, em documento, o seguinte texto: “nós, abaixo-assinados, nos conjuramos e prometemos, em serviço da liberdade, não faltar, a todo o tempo que for necessário, com toda a ajuda de fazendas e de pessoas, contra todo risco que se oferecer, contra qualquer inimigo, em restauração de nossa Pátria…”. Esta foi a primeira notícia do uso do substantivo “Pátria” em documento histórico. Aliás, na nossa atual Constituição (1988), esse bendito termo só aparece uma vez – uma única vez – exatamente no Artigo 142, que versa sobre a destinação das Forças Armadas. Novamente, sob o amparo da sociedade brasileira, Defesa e Pátria se unem.

A palavra “Pátria”, de origem latina, guarda relação com “patres”, ou seja, com os antepassados, designando raízes, história, compromisso, amor, dedicação, orgulho, trabalho, coesão, compreensão e sacrifício. Sinceramente, acredito que, hoje, mais do que ontem, é necessário o culto e o cultivo do nobilíssimo sentimento patriótico. Esse sentimento precisa vibrar no peito da nossa gente, fortalecendo a coesão da nossa sociedade e o compromisso com a nossa Nação. Como seria bom se a família e a escola conjugassem o conceito de estado-nação, explicando que é ali que a vertente geopolítica do Estado se une com a história e com a unidade ética (ciência da conduta) e cultural da Nação. Ali, na união da família com a escola, é que ocorre a convergência daquilo que se aprende com os “valores” que devem reger nossa vida. Esse somatório – aprendizado e valores – constitui-se no que denominamos Educação: ingrediente fundamental do progresso do nosso Brasil.

Portanto, motivado, talvez, por estar muito próximo do Riacho do Ipiranga, acredito que se trata do momento de reforçar os sentimentos de estado-nação, de soberania, de independência, de ordem, de disciplina, de hierarquia, de ética, de honestidade, de fortalecimento institucional, de justiça, de unidade nacional, de coesão, de amor ao Brasil e de patriotismo. Todos eles, ao ser enaltecidos, contribuirão para que o País seja o gigante que merece.

Que no dia 7 de setembro, muitos brasileiros, ao despertar, possam elevar os pensamentos a Deus, pedindo bênçãos para nossa grande Pátria.

Que no dia 7 de setembro, nossos Soldados e nossos colegiais possam vibrar nas paradas e que a população possa festejar o aniversário do Brasil.

Parabéns, Brasil, pelo êxito de seus filhos no Haiti!
Parabéns, brasileiros!
Feliz Dia da Independência!

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Daniel Dutra
Daniel Dutra
6 anos atrás

Infelizmente tem gente la de cima que so pensa em maltratar essa pátria, e pensar que esse pais tem quase tudo pra dar certo.

Sim, eu sei que o povo tem sua culpa, porem nosso sistema tambem nao ajuda..

SmokingSnake
SmokingSnake
6 anos atrás

Foi só se retirarem de lá que chegou um furacão categoria 5, o mais forte já registrado no atlântico, não vai pegar em cheio mas deve causar um estrago.

Gil
Gil
6 anos atrás

Recordem: O Haiti é aqui

Silva
Silva
6 anos atrás

Parabéns Brasil, por valorizar mais estrangeiros sem importância alguma para o país, gastando-se bilhões do dinheiro público, enquanto seus próprios cidadãos estão largados a própria sorte, sendo massacrados pela violência endêmica todos os dias de norte a sul nesse país. E ainda exitem idiotas que colocam a mãozinha no peito e dizem ser brasileiros com orgulho. E me pergunto, orgulho de quê? Jamais farei isso! Bem, afinal de contas, cada um com suas insanidades e com o país que merecem viver.

Renato Vieira
6 anos atrás

Sempre fui contra o Brasil gastar os escassos recursos mandando tropas para outros países. Já se fala numa próxima missão e que possivelmente será em África. Temos não somente um e sim vários haitis e repúblicas africanas aqui dentro do nosso território. Temos região sem água , falta de infraestrutura por toda parte, instabilidade política, corrupção institucionalizada e na segurança às ruas estão dominadas por bandidos e seus bordões do tipo “perdeu playboy ” e por aí vai. O estado brasileiro não conssegue dá conta de prende-los, e se prende, quando o meliante não é solto na audiência de Custódia,… Read more »

Nilo Rodarte
Nilo Rodarte
6 anos atrás

Entendo e respeito a opinião dos colegas, mas ouso discordar delas. Para um país com as dimensões e pretensões do Brasil e ainda mais considerando que com tudo isso nçao temos um possível inimigo declarado que possa levar a um combate, acho muito importante sim essas missões para as forças armadas para integração, treinamento e, não menos importante, convívio com outras forças e problemas. O gasto com isso é uma fração do que se desperdiça e se rouba nesse país e não vai ser a não participação nessas missões que vai adiantar alguma coisa. Já o problema da violência urbana… Read more »

Gil
Gil
6 anos atrás

@Silva, te equivocas

A violencia não é endemica, (esse seria o caso da corrupção), a violencia seria mais bem epidemica.
Se juntamos a essa equação um estudo que diz que 70% dos brasileiros são analfabetos funcionais e que muitos brasileiros são lacaios de terceiros paises, teremos a formula necessaria pra esse pais estaja sempre no limiar da mediocridade.

Fabio
Fabio
6 anos atrás

Os nossos militares foram autorizados a ficar por lá por conta do furacão! Parabéns aos nossos bravos militares por não deixarem na mão o povo do Haiti nesta hora complicada!

http://www.itamaraty.gov.br/pt-BR/notas-a-imprensa/17405-apoio-da-missao-das-nacoes-unidas-para-a-estabilizacao-no-haiti-minustah-diante-da-passagem-do-furacao-irma

Carlos Alberto Soares
Carlos Alberto Soares
6 anos atrás

Parabéns aos militares, comandados e comandantes no Haiti, ponto.

Rodrigo Martins Ferreira
Rodrigo Martins Ferreira
6 anos atrás

Nilo Rodarte 8 de setembro de 2017 at 11:40

Nilo,

“pretensões” é para quem tem capacidade e não para quem apenas acha que tem.

A situação econômica, política e social do nosso país, a pretensão primária é resolver os nossos problemas internos.

Amenizado isto o mundo por si só já começará a nos ver com outros olhos.

André
André
6 anos atrás

Política Social e econômica não se faz com Forças Armadas as mesmas são validas para garantir a Segurança Nacional do território Brasileiro e não para reforços banalizados de segurança pública nos estados, se você quer uma instituição forte nesse país saiba votar e cobrar do seu candidato o que ele prometeu e não atribuir todas as tarefas nas mãos dos Generais. Hoje o Exército pavimenta estradas, leva água potável para a população do interior do nordeste, faz GLO no rio, a Marinha faz serviços sociais levando serviços de saúde com dois navios hospitais a população ribeirinha dos estados que formam… Read more »