Desinteresse esvazia grupo do Brasil com Índia e África do Sul

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IBAS

Com sua relevância reduzida pelo Brics, Ibas não tem reunião de cúpula de seus chefes de Estado desde 2011. Grupo era “menina dos olhos” do ex-presidente Lula; acordo com a UE e cúpula do Mercosul também não andam

PATRÍCIA CAMPOS MELLO
DE SÃO PAULO

ClippingO Ibas, grupo que une Índia, Brasil e África do Sul, é mais uma vítima do desinteresse da presidente Dilma Rousseff por política externa. A entidade, que se diferencia do Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) por reunir apenas democracias, não terá reunião de chefes de Estado neste ano, como planejado. O Ibas não faz reunião de cúpula desde 2011.

Em 2013, a presidente Dilma cancelou em cima da hora sua participação na cúpula em Nova Déli, que marcaria os dez anos do grupo, alegando conflito de agenda. Enquanto se buscava outra data, possivelmente na ida ou na volta de uma visita ao Japão, começaram os protestos no Brasil e a viagem ao Japão foi cancelada.

Os indianos ficaram melindrados. A presidente prometeu remarcar, mas não o fez. Neste ano, a reunião ia ser realizada um dia antes da cúpula do Brics, em 15 de julho, em Fortaleza, mas foi cancelada de novo. Dessa vez, a culpa não foi do Brasil.

Segundo a Folha apurou, a África do Sul se opôs, argumentando que seria melhor “descolar” o Ibas, que une três aspirantes a membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU, do Brics, que tem países que já fazem parte do CS (China e Rússia).

Além disso, o premiê da Índia, Narendra Modi, terá reunião bilateral com a presidente Dilma no dia 16, o que tornou o tempo mais curto. E haverá a esperada visita de Estado do líder chinês, Xi Jinping.

MENINA DOS OLHOS

O Ibas, criado em 2003, era a menina dos olhos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. “O lançamento do Ibas foi meu primeiro compromisso em política externa. O Ibas é nossa resposta a uma ordem internacional desigual e injusta”, discursou Lula durante a cúpula do grupo em 2010.

Oficialmente, o Itamaraty afirma que “a presidência de turno do Ibas incumbe à Índia, que deverá conduzir, oportunamente, consultas entre os três membros com vistas a determinar uma data conveniente a todos para a realização da próxima cúpula do foro”.

Para um alto funcionário do governo que acompanha a situação, o Ibas não morreu, mas passa por uma “crise de identidade porque acabou engolido pelo Brics e sofreu com a falta de interesse da presidente Dilma por temas internacionais”.

Hoje, a principal função do grupo, além de alinhar posições políticas em cúpulas, é o Fundo do Ibas, que financia projetos em países pobres. Apesar de muito elogiado, o fundo tem a contribuição de apenas US$ 1 milhão por ano de cada membro.

Como comparação, durante a cúpula dos Brics, será criado oficialmente o banco do grupo, que deve ter aporte inicial de US$ 10 bilhões, mais US$ 40 bilhões em garantias, para financiar projetos de infraestrutura e desenvolvimento sustentável.

Com a lenta morte do Ibas, acumulam-se baixas na política externa da gestão Dilma.

Apesar do alarde da presidente em reunião com líderes da União Europeia em fevereiro, em Bruxelas, o acordo UE-Mercosul continua congelado. A troca de ofertas (de produtos que teriam suas tarifas zeradas em caso de acordo) deveria ter ocorrido em dezembro, mas não deve sair antes do fim do ano.

O Mercosul nem sequer consegue marcar sua reunião de cúpula. O anfitrião é a Venezuela, e a data inicial era dezembro. Foi desmarcada e anunciada para janeiro. Diante dos protestos e da instabilidade no país, ainda não foi reagendada.

“Com o problema venezuelano e, agora, a crise argentina, estamos somente fazendo remendos no Mercosul”, diz um diplomata.

O aprofundamento da relação comercial com a Índia, que se daria pela ampliação do atual acordo de preferências tarifárias, também está em banho-maria. Aguarda consulta pública.

“A presidente não está focada em política externa, sua única preocupação é política interna”, diz Oliver Stuenkel, professor de relações internacionais da FGV de São Paulo.

“A reunião dos Brics terá muitos líderes e seria uma ótima oportunidade para ativismo do Brasil, mas duvido que isso vá acontecer.”

FONTE: Folha de São Paulo

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