Por Guilherme Poggio

Mecânica

O veículo possui todas as características típicas de um fora de estrada com tração integral nas quatro rodas. A suspensão independente ajuda a manter o conforto em níveis razoáveis para condições de terreno irregular. As quatro rodas contam com freios a disco e sistema antibloqueio ABS. Além disso, os pneus contam com sistema automático de calibragem e são do tipo “run-flat” (reforçado nos flancos, ombros e talões), que permitem rodar mesmo, por certo tempo, sem ar pressurizado no seu interior.

Derivado do motor do utilitário (van/micro-ônibus) IVECO Daily, o motor do LMV é um turbo-diesel 3.0 cuja potência pode chegar até 220 HP (como no caso do LMV2). O protótipo que se encontra no Brasil está limitado a 190 HP. A velocidade máxima em estrada pavimentada pode chegar a 130 km/h, embora a mesma possa ser limitada eletronicamente (como é o caso da viatura que está em testes em Sete Lagoas).

O câmbio automático é um item que nasceu com o veículo e não há opção de câmbio manual. No entanto, a partir de 2015 a versão mais recente do LMV teve a transmissão automática ZF de seis velocidades modificada para oito velocidades (a mesma adotada no LMV2). A adição de mais duas velocidades tornou a transição entre elas mais suave quando o veículo é guiado em condição fora de estrada. O câmbio automático de oito marchas está instalado do protótipo do VBMT-LR e deverá ser adotado pelo EB.

Tropicalização

Quando um novo produto é desenvolvido, o clima onde ele será empregado também deve ser considerado. Cada clima possui as suas demandas e os diferentes materiais e equipamentos respondem, de maneira diversa, aos desafios impostos pelas condições do ambiente.

A OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte) possui uma série de procedimentos padronizados chamados de STANAG (Standarization Agreement) para a fabricação de equipamentos de emprego militar. Um deles, conhecido como STANAG 2895, define a faixa de temperatura e umidade relativa que estes equipamentos trabalham / operam sem restrições. No caso do LMV, ele foi originariamente projetado para operar nas condições definidas entre os ciclos A2 e C1, cuja faixa de temperatura vai de -32ºC até 44ºC (no caso do LMV2 ele está capacitado até o ciclo A1, ou 49ºC).

Um LMV padrão norueguês da versão mais recente, o LAV 4. Por mais que o ambiente do país seja polar, muitos LMV da Noruega foram empregados no calor do Afeganistão.

Mesmo seguindo o padrão STANAG 2895, tropas norueguesas relataram casos de superaquecimento do motor e da caixa de câmbio do LMV no Afeganistão. Além disso, o veículo tinha problemas com excesso de poeira e areia que atingiam o filtro de ar principal. Diante das lições aprendidas, mais de 300 modificações foram introduzidas no projeto e a Noruega voltou a comprar novos lotes de LMV mais avançados. Pode-se dizer que o Brasil acabou se beneficiando dessa experiência no Afeganistão e, assim, terá um LMV muito mais aprimorado do que aquelas primeiras viaturas que equiparam diversos exércitos, como o britânico e italiano.

No entanto, a necessidade da “tropicalização” vai além das condições ambientais do país e diz respeito também à situação da infraestrutura local. A principal delas, no caso brasileiro, é a baixíssima qualidade do combustível diesel produzido aqui. Em função disso foi necessário modificar, entre outras peças, a bomba de combustível do LMV, que agora possui um reservatório maior.

Blindagem

Além das soluções de engenharia descritas anteriormente, a sobrevivência do LMV depende também da sua blindagem. Deve-se destacar que apenas a célula de sobrevivência pode ser blindada. Este é um conceito que busca proteger a tripulação e, ao mesmo tempo, diminuir o peso total do veículo (consequentemente aumentando a mobilidade) não blindando outras partes como o motor e o bagageiro. Neste aspecto, o veículo é bastante versátil para atender às diferentes especificações e missões, onde o tipo de ameaça é variável.

Esquema de blindagem modular da célula de sobrevivência do LMV. Esta blindagem pode ser removida ou até mesmo incrementada.

Os clientes podem optar por balancear carga transportada e blindagem. Nas missões onde ameaças de baixa intensidade são esperadas, a economia de peso com a redução na blindagem pode significar mais carga transportada. O oposto também é verdade.

A blindagem pode ser adicionada ao veículo na forma de kits e, segundo o seu fabricante, pode ser montada em cerca de dez horas-homem no campo (longe dos centros de apoio). O nível de blindagem segue o estabelecido pelo padrão STANAG 4569. Este padrão define seis níveis crescentes de blindagem (do menos blindado para o mais blindado) e nem todos são aplicáveis a veículos leves.

No caso do LMV, ele aceita blindagem até o nível 3 balístico (projétil 7,62x51mm AP a 30 metros com velocidade de 930 m/s) e até o nível 2a para minas e IED (detonação de explosivo com massa de 6 kg sob uma das rodas).

O EB definiu que a blindagem da sua futura Viatura Blindada Multitarefa, Leve de Rodas (VBMT-LR) será STANAG nível 2 balístico (projétil 7,62x39mm API BZ a 30 metros com velocidade de 695 m/s) e nível 2a para minas e IED.

Furtividade

As viaturas da geração do LMV incluem medidas para reduzir as assinaturas térmicas, acústicas, visuais e de radar. Ou seja, houve preocupação quanto à furtividade, algo que a geração anterior de veículos leves sobre rodas não se preocupava.

Para reduzir a assinatura térmica, foram adotadas medidas como embutir o duto de gases de exaustão no chassi, proteger pontos quentes como o compressor , além de utilizar materiais com alta capacidade de absorção IR (infravermelho) na parte externa do veículo.

Quanto à assinatura acústica, grande preocupação foi dada para dois itens: motor e sistema de exaustão. Neste caso foram utilizados painéis de abafamento. Para reduzir a assinatura visual, o veículo foi projetado com um perfil relativamente baixo (equivalente ao de um Land Rover Defender), silhueta discreta e é pintado com tintas policromadas de baixa emissão.

Para completar, procurou-se reduzir a seção reta radar (RCS em inglês) com  uso de formas e ângulos externos que desviassem as ondas. Também foi aplicado um revestimento pouco refletivo.

Para ler os textos anteriores clique nos links abaixo

Nos textos seguintes o “Forças Terrestres” trará mais informações sobre o projeto do LMV.

O editor Guilherme Poggio viajou à Sete Lagoas a convite da IVECO/CNH.

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Rodrigo Silveira
Rodrigo Silveira
4 anos atrás

Parabéns pela série de matérias.

Marcelo-SP
Marcelo-SP
4 anos atrás

Alguém sabe a razão de não se adotar o mais moderno LVM 2, além de, provavelmente, custo?

Doug385
Reply to  Marcelo-SP
4 anos atrás

Sim. Custo.

Jorge
Jorge
4 anos atrás

Boas

Para quem quiser perceber a necessidade destes equipamentos, fica abaixo o link para as últimas notícias da RCA, onde os páras portugueses continuam a combater as milícias. É bem visível os danos causados aos humvees blindados numa emboscada, que estão a ser usados e vão ser substituídos na próxima rotação pelos Uro Vamtac ST5 bn3 (stanag LVL 3 balístico), equivalente ao LMV. Uma pergunta. Pq é que exército brasileiro não escolheu o nível de proteção mais elevado? E está prevista a instalação de torre?

https://www.emgfa.pt/pt/noticias/1454

https://www.facebook.com/emgfa/videos/2357731197678244/

http://www.operacional.pt/uro-vamtac-st-5/

Marcelo-SP
Marcelo-SP
Reply to  Guilherme Poggio
4 anos atrás

Caro Poggio! Não sei qual a efetividade real, além dos números, para cada padrão. Mas me parece que, nesse caso específico, quando se está sob fogo, não há o “está bom”. Acho que a pior coisa para um soldado em campo é achar-se protegido contra armas leves e descobrir na ação que “faltou um pouco” para a blindagem segurar. Entendo que, pela falta de dinheiro, não há como comprar os melhores e mais modernos caças ou fragatas. Mas, ao menos no equipamento pessoal e de transportes de pessoal na linha de frente, deveríamos oferecer a melhor proteção aos nossos soldados.… Read more »

Marcelo-SP
Marcelo-SP
Reply to  Marcelo-SP
4 anos atrás

Por fim, registre-se: linda reportagem, Poggio!!!

Marcos R.
Marcos R.
Reply to  Marcelo-SP
4 anos atrás

Marcelo, na verdade tenta-se encontrar o melhor equilíbrio peso/proteção, muitas vezes um nível maior de proteção pode deixar o veículo com menor mobilidade, também expondo a tripulação a riscos.

rdx
rdx
4 anos atrás

A ausência de blindagem no motor torna LMV completamente inútil para combate urbano. Em confrontos nas favelas do RJ, por exemplo, os atiradores do tráfico, cobrindo as principais vias de acesso, costumeiramente alvejam a área frontal do veículo, ou seja, o compartimento do motor e o para-brisas. Quebrou motor do LMV com tropinha de 4 no interior da favela, e aí? O que diz o manual do EB?

Entusiasta Militar
Entusiasta Militar
Reply to  rdx
4 anos atrás

O Manual do Exercito Brasileiro diz que somente alguém que nao entende nada de FFAA iria sugerir uma incursão em zonas de risco de um veiculo leve sem as devidas proteção de um blindado maior e mais protegido, seja um Guarani ou ate mesmo CLAnf’s como ocorreu ha alguns anos atras.,

rdx
rdx
Reply to  Entusiasta Militar
4 anos atrás

Compraram um blindado que precisa ser escoltado em zonas de risco? Só reforça a tese de que o LMV é inadequado para ações táticas.

rdx
rdx
Reply to  Guilherme Poggio
4 anos atrás

Concordo plenamente, Poggio. A última aventura do EB nas favelas do Rio terminou com 05 militares mortos (incluindo 01 capitão), 12 militares indiciados por homicídio (caso da família que foi confundida com bandidos)…e a imagem institucional arranhada.

Art
Art
Reply to  rdx
4 anos atrás

se quer fazer faz direito, Decreta GLO, dá liberdade pra tropa, toque de recolher na favela, um decreto generico sem garantias, que agrada a politicos e chefes de comunidade que são laranjas do crime dá no que ocorreu.

Maurício Veiga
Maurício Veiga
Reply to  Guilherme Poggio
4 anos atrás

Guilherme com todo respeito ao seu comentário e ponto de vista, segurança pública é dever de todos, as FAs estão inseridas neste contexto, está na constituição!!!!

nonato
nonato
Reply to  Maurício Veiga
4 anos atrás

É um caso de guerra.
Mas se formos guerra, tem de ser para valer.
Das vezes anteriores, entram mas não dominam.
Ou os traficantes voltam.
Tem de ser controle total.
E se “civis”, agindo em benefício de bandidos ficarem protestando ou atrapalhando, devem ser tratados como cúmplices.

Wilson
Wilson
Reply to  nonato
4 anos atrás

Sim, os “civis” devem colaborar com os militares ou são considerados bandidos, mas depois que estes militares cansarem de brincar de polícia e voltarem aos quartéis quem vai proteger estes “civis” da vingança dos bandidos.

Marco
Marco
4 anos atrás

A previsão de emprego está na lei e na doutrina. GLO

Glaison
Glaison
4 anos atrás

O motor estando vulnerável não torna o blindado quase tão vulnerável quanto um carro qualquer? A blindagem da cabine protege os tripulantes de tiros de fuzil, mas se esses tiros forem direcionados ao motor, o veículo pode ser paralisado.

Glaison
Glaison
Reply to  Guilherme Poggio
4 anos atrás

Grato pela explicação.